domingo, junho 29, 2008

Respeitar a si mesmo

“Não somos aquilo que fizeram de nós, mas o que fazemos com o que fizeram de nós”.

(Jean Paul Sartre)

O pensamento de Sartre remete a nata do pensamento existencialista de fazer escolhas, porque sempre fazemos do outro nosso próprio inferno, mas nosso próprio inferno é feito de nossas próprias escolhas. A celebre frase mostra que vamos criar ao longo de nossa existência uma mascara social que remete tudo que é moralmente aceito, como que roupa vestir, como se portar, como amar, como aceitar e toda essa conduta mecanicista. Nesse inferno que o próprio ser humano faz sempre tem que culpar de fora para dentro e não de dentro para fora, porque sim, somos responsáveis pelos nossos atos.

Nesse ato segundo o filosofo: "Tu és metade vítima, metade cúmplice, como todos os outros", ou seja, somos responsáveis pelo que nos vitima; não adianta ter um ar de vitima, pois somos parte vitima e parte cúmplice com tudo que nos acontece. Isso é um ato de escolher o que se deve escolher, ou um ato de ser o que se deve ser, parte do principio de toda causa consiste em um efeito; pois toda dor é uma escolha de se ficar com ela, ou jogá-la fora. Mas têm antes do nosso ato de escolha a certeza que somos vitima e cúmplice ao mesmo tempo juiz e réu de seus próprios “crimes” de si mesmos.

O precursor do existencialismo Kierkegaard, dizia que o ser humano é levado a angustia porque nas escolhas sempre teremos uma ponta de angustia. A angustia vem de querer fazer escolhas e essas escolhas nos fazem escolher o nosso caminho e o caminho nem sempre é bom. Mas essa procura é a existência da procura de Deus, alcançar seu poder e seu espírito e isso só podem ser alcançados com a fé; mas nem sempre temos fé naquilo que não vemos, temos que ter uma visão e ai acontece a angustia, a procura do espírito universal fora de nós, mas ele esta em si mesmo e esse espírito que nos faz escolher, nos faz amar ou odiar uma pessoa ou outra coisa.

Erich Fromm, psicanalista alemão, diz que esse amor que tanto procuramos é nossa separação com a natureza que esta muito bem escrita nos Gêneses onde o homem comeu o fruto da ciência do conhecimento e saiu da condição de animal no meio de todos, para integrar a cadeia evolutiva de homo sapiens sapiens. Mas essa separação causou uma grande perda dentro de si e uma grande angustia como existe a polaridade masculina e feminina, existe um querer integrar um ao outro; daí essa procura desenfreada da chamada “alma gêmea” e integrar-se mutuamente; esse outro ser humano vai suprir essa perda, mas esse integrar e querer conhecer o outro ser humano ele se torna um sádico. Por que o sadismo? Uma criança para conhecer tem que quebrar, tem que destruir, porque assim ela vê o objeto por inteiro; mesmo um animal, pensamos que está judiando, mas ela esta conhecendo. Mas o conhecer é machucar o individuo porque estamos desmontando ele para conhecer, para ver se é igual o que pensamos que era; muitas vezes não é, mas queremos que fosse.

Mas até onde podemos se submeter a vontade alheia para preservar nossa integridade social? Quando vivemos em sociedade, vivemos com mascaras sociais diversas e de todo tipo, para enquadrar dentro de nossa sociedade. Muitas dessas mascaras foram forjadas para a manipulação social junto com o meio que predomina, como por exemplo, nos Estados Unidos da America predomina o pensamento protestante pela maioria o ser. No mundo grego antigo predominava a escultura bela, o corpo belo por causa do deus Eros, tanto que a palavra erótica vem desse deus e há uma diferença significativa com pornografia; pois uma imagem erótica é uma imagem que dá uma idéia apenas no ato sexual, mas a pornografia é a imagem clara. Não entramos em detalhes, mas o que predominava era o belo na perfeição que foi distorcido pelos nazistas na predominância da raça dita ariana; mesmo o porquê, toda raça de pele branca veio dos arianos, mas é um assunto para outro artigo. Quando uma sociedade predomina uma mascara social, como vimos nos estudanenses e os gregos antigos, tendem a determinar que aquela imagem tenha que ser a comum que para ter uma real convivência social. Hoje predomina a educação de submissão por causa da vergonha, porquanto as pessoas devem dar tudo pelas amizades e nada para si, porque o que conta é o agrado e a boa convivência dos outros. Não se trata de egoísmo.

O egoísta não tem respeito nem com ele por isso não pode ter amor próprio, não pode agradar ninguém porque ele mesmo não se agrada porque ele vive seu próprio mundo; o narcisismo freudiano é diferente, porque ele não tem nem respeito próprio e nem egoísmo, ele tem a libido pra ele próprio. É até estranho, mas ele tem uma atração por ele próprio e somente ele será belo. Como a lenda de Narciso que ao olhar seu reflexo no rio fica hipnotizado, que cai dentro do lago e morre afogado, é o que acontece com uma pessoa narcisista ele fica hipnotizada e não vê mais nada. Mas o respeito em si próprio é a predominância de si sem ser egoísta e nem narcisista, apenas respeitar as vontades de si próprio e deixar bem claro.

Mas a maioria não deixa tão claro assim e fica na premissa que devemos achar que os outros têm que perceber o que sentimos o que amamos o que achamos e não é verdade. Quando fazemos uma escolha temos que deixar bem claro para quem e para que aquela escolha sirva, não ficar querendo que o outro descubra isso, mas a grande maioria quer assim. O grande erro do ser humano, isso é conseqüência de uma sociedade neurótica industrial, é a insegurança de seus próprios atos graças à imposição de séculos inquisitória, que levou o ser humano a se recolher para dentro de si mesmo e não falar o que pensa e o que sente; parece exagero, mas toda obra de psicologia e psicanálise, fala de um inconsciente que vem dês de nossos ancestrais que foram podados na idade media. Já as pessoas orientais têm outro mecanismo de mecanizar o ser humano, como se ele pensar por si mesmo, sairá do controle.

O controle social é muito importante para o capitalismo predominante, não só o capitalismo como também nos ditos países socialistas e nos países com outros regimes, que controlam a massa. Nietzsche dizia que a massa tem espírito de rebanho, pois se deixava levar para o matadouro. Mas é muito complexo hoje em dia, tal afirmação requer uma analise minuciosa para entendermos essa predominância pacifica, pois três fatores impedem a rebelião da massa. Primeiro existe o interesse, por ter o que para alguns, interessa a massa não se rebela e assim, para eles tudo é muito cômodo. Segundo, está de alguma maneira ligada a primeira questão, que é por muito tempo feita pelos governantes e que veio de Roma antiga, a política de “pão e circo”, ou melhor, dizendo “pane circus”, que consiste em dar ao povo o que ele quer: que em Roma dava-se pão e shows de gladiadores para agradar e divertir os súditos, ou cidadãos. O que acontece hoje com a predominância capitalista, se dá o divertimento levado pelo futebol, pelo automobilismo, pela propaganda que para sermos saudáveis temos que fumar, beber e ir a balada, que sexo se deve fazer e é saudável, mas use camisinha (que lógico enriquece as industrias que mencionei), de uma forma clara é o ponto chave de alienar a grande massa. Terceiro, a educação familiar e não a escolar, pode deixar a massa pacifica e conformista já que se todos podem evoluir, mas não querem por achar que nunca vão alcançar uma melhor condição; isso é agravado com as religiões que pregam a paz de espírito, que nada mais é do que pacificar a massa.

Por falar em religião, já que tanto pregam dar a outra face, tanto Jesus como outros mensageiros do “EU SOU” (porque assim disse a Moises), disseram que devemos amar-nos para assim amar ao próximo. A arte de amar, como toda arte, tem que ser aprendida com pratica, amar é a pratica de fazer escolhas e mesmo amar a si mesmo é uma pratica, a pratica de respeitar a si mesmo. Dizer que ama uma pessoa ou a si mesmo é muito fácil, porque palavras são ditas todas as horas e todos os dias, mas fazer amar e amar é muito difícil pelo ser humano ainda não diferenciar suas escolhas. As escolhas são as ações de ficar ou ir, de escrever ou ler, de comer ou não, de amar ou odiar; pois temos ainda a idéia romântica que não escolhemos quem ficamos, mas realmente escolhemos, por inúmeras associações. Essas associações são o que idealizamos como uma escolha são as culturas e o que uma comunidade pensa.

Tudo isso é apenas o mundo em que o grande mal do século XX é a solidão porque a arte de se amar e de amar outros ficou desconsiderado, ficou uma coisa subjetiva, uma coisa desconsiderada, ficou uma coisa associada apenas no sexo. Mas como eu disse, temos idealizações que associamos ao ser que queremos ao nosso lado, muito porem, que muitas delas são ilusões. Essas ilusões (como li no livro do historiador Pedro Paulo Funari, Grécia e Roma, uma definição de publicitário ótima, que são os sofistas de agora por vender um mundo ideológico e ilusório. Apesar de fazer um ano e meio de publicidade e propaganda, posso dizer que o problema é da universidade que negou me dar bolsa de estudos, assim, nada tenho com os novos sofistas e posso fazer também essa associação), são criadas dentro da publicidade deixando um mundo de fantasia e um amor cheio de sorrisos, um respeito próprio artificial e fazendo o ser humano um misero produto. Ele se torna a medida de todas as coisas dês que ele compre, ele consuma, o amor próprio e o respeito é ser descolado, é ter um sorriso de comercial de pasta de dente. Será que eu escolher comprar algo porque isso me trás status é um direito de escolha ou uma ilusão que criaram em minha mente? Será que o menino que quer uma calça da moda ou um tênis para ter status para aparecer é uma escolha ou uma medida da ditadura do sofista publicitário, que pode sim ser responsáveis por inúmeros crimes e amores ilusórios? Mas ai voltamos a Sartre, porque embora temos uma ditadura ideológica e estética dos sofistas publicitários, temos uma parte vitima e uma parte culpado.

Vitima por ainda não tirarmos, ou, não temos mecanismos para nos livrar de todas as ilusões que somos expostos. Culpados porque temos o habito de aceitação de tudo que ouvimos ou vemos, como se aquilo fosse à maior verdade de todos os tempos. Imagine agora um motorista bêbado, mesmo ele escolher consumir bebida alcoólica para se autodestruir, será inevitável ele ou se matar (uma escolha dele), ou colidir com um e a escolha só irá interferir a si mesmo. Mas se colidir com outro automóvel e matar ou ferir outra pessoa, vai interferir na escolha dela e interferir a outrem; então as escolhas podem muito bem interferir a si ou a outrem, mas que nos dois casos, existem os fatos e suas causas. Portanto, muitas escolhas são reflexos de ilusões que ao longo da vida são nos dados em pautas.

Talvez a grande dificuldade é assumir o que somos, o que nossa natureza compota de si, a existência de nossas próprias vontades; se não temos autonomia e nem eles para desfrutar, então é melhor nem fazer nada e ficar vendo as sombras da caverna. Isso mesmo, a caverna platônica que somos acorrentados olhando sombras em uma parede onde pensamos ser verdade, é mera projeção daquilo que nos fazem pensar que seja uma verdade. A verdade nos liberta e nessa liberdade sabemos nos respeitar e respeitar o outrem, assim sendo, somos condenados a ser livres por conter nessas escolhas particulares e que reflete dentro da historia humana, pois reflete dentro da sociedade como um todo.