Amauri
Nolasco Sanches Junior
Sempre quando eu vejo a pergunta do
título, me vem a cabeça a pergunta clássica de todo grupo de
deficientes (que chamo de guetos): “você namoraria uma pessoa com
deficiência?”. Parece uma resposta óbvia, mas, tem muita coisa a
ser analisada nessa pergunta. Se antigamente eramos comandados por
preceitos religiosos, depois ideológicos, hoje somos comandados pelo
marketing do bem. O marketing do bem sempre vai nos mostrar que a
vida tem que ser mais saudável, que as pessoas devem sempre sorrir e
que existe um propósito para tudo. Talvez, objetos tenham algum
propósito, mas a vida é o que fazemos dela e, muitas vezes, erramos
de não fazer o que queremos por causa do outro. Minha cadeira de
roda tem mais propósitos do que uma pessoa que segue tendências, ou
seja, se você quer um mundo melhor, você é um nada.
Voltamos a pergunta. Temos uma
sociedade movida pela visão de custo e beneficio. Se você acredita
que as pessoas amam seus filhos e querem o bem deles, você deve ser
um idiota ou um mau-caráter. A maioria investe nos filhos para terem
o retorno na velhice, quando os filhos (segundo a sociedade) deveria
cuidar dos pais. E quando se tem um filho com deficiência? Será
mesmo que essas pessoas pensarão igual? Afinal, os filhos são um
investimento que não há um retorno cem por cento, mas, há uma
tranquilidade mais tarde. Ai que está, desde muitos milênios se
tem seres humanos com deficiência, mas, na antiguidade — mais ou
menos, até a modernidade — eramos abandonados, mortos,
desaparecíamos ou eramos trancados. Até hoje, crianças com
deficiência são enterradas vivas dentro de aldeias indígenas.
Claro que nem todos eram mortos, algumas pessoas com deficiência
eram oráculos ou druidas, que remontam a visão mistica da
deficiência dentro da sociedade. Sim, há uma visão mistica da
deficiência. Essa visão, muitas vezes, atrapalha a vida das pessoas
com deficiência. Muito antigamente, se considerava deficientes como
pessoas misteriosas e muitas outras pessoas, tinham medo por causa
desse mistério. Mesmo a ciência explicar as causas, há ainda essa
mistica e o medo ancestral de nós.
Depois dessa explicação, imagina
uma mulher apresentar um namorado de cadeiras de rodas para sua
família. O pai, que tem a visão que o homem deve prover a casa, faz
a pergunta clássica: o que ele pode oferecer para você? Ou até
mesmo: que loucura é essa? Porque a sociedade tem a deficiência
como um tomento para a pessoa , um sofrimento que deve ser dolorido
para todos que se envolvem conosco. Mesmo que esse rapaz trabalhe,
ganhe razoavelmente bem, nunca vai ser o bastante para a família da
moça. Claro que há exceções. Mas a regra é essa. A luta é
constante e deve ter bastante amor envolvido, porque quando começa a
parecer as questões de ter filhos e ter uma casa só do casal, as
coisas começam a ficar piores. Isso é quando a mulher ou o homem —
dei o exemplo da mulher, porque sou homem e a maioria dos relatos são
de homens — andam e tem um emprego. E quando há um casal de
deficientes dentro da relação?
A questão da deficiência é a
questão de todo ser humano que a sociedade não aceita como ser
humano, ou por ignorância de não conviver conosco, ou por ser
canalha o bastante para não perceber que é um nada. Uma pessoa que
tem qualquer deficiência, é uma pessoa antes de tudo e deve ter
seus direitos preservados junto com seus deveres. Por outro lado, o
povo não é tão democrático como pensa os que idealizam uma
democracia linda e um mundo melhor. Só dar uma casa, comida, saúde
e tranquilidade, o povo vive nos piores regimes possíveis. O século
vinte mostrou isso. Então, essa história que o povo ama a liberdade
e é condicionado a achar que o outro ser humano não é humano, é
mentira. Para uma grande maioria, pessoas com uma cadeira de rodas ou
outro aparelho, são pessoas que atrapalham e tem que ser trancadas
em um cantinho e só. Quem são essas pessoas que ficam no meio do
caminho num shopping ou numa loja qualquer? O caso do Véio da Havan
é o mesmo caso de agências de publicidade que não contratam,
empresas que não se adéquam, o poder publico que não acessibiliza.
Ainda, temos que provar que somos deficientes toda hora para o poder
publico.
O amor entre deficientes na nossa
sociedade que ainda acha que está na era vitoriana (num surto
reacionário), é uma coisa bastante difícil de aceitar. Quando saia
com minha noiva, por exemplo, sempre as pessoas perguntavam se eramos
irmãos. Essa associação de coletivo (como deficiente namorar
deficiente ou irmãos com deficiência), sempre foi formado como um
gueto que frequentamos, ou o ideário que as pessoas iguais devem se
relacionar. Isso um pouco é culpa das novelas idiotas da TV Globo
que alimentam essa visão. Por outro lado, os deficientes alimentam
esse tipo de imagem saindo em bando, ou até mesmo, participando de
grupos do Facebook que só fala do tema deficiência. Eu sempre não
gostei de ficar em grupos que o tema é deficiência, mesmo o porquê,
deficientes acham que discussões são brigas.
A humanização da deficiência veio
com a desumanização do sentimento. Se somos seres humanos, porque
será que não temos sentimentos ou sexualidade? Exato. Vamos ser
sincero, você acha que pessoas com deficiência são crianças
eternas e não tem nenhum desejo sexual? Acho que quem acha isso são
idiotas ou são canalhas o bastante de construir conceitos errados
para alimentar seu próprio ego. Já vi homens com deficiência se
aproveitarem dessas idiotices e se fazerem de alienados, bolinavam as
moças e depois se escondiam atrás da mãe. Há canalhas em todos os
lugares e eles se aproveitam dessas narrativas para se esconderem.
Deficientes não são diferentes, são pessoas como qualquer ser
humano e o caráter dependem dos valores que recebeu. Agora,
deficientes sentem tesão, são homossexuais e fazem coisas que nem
imaginam que possamos fazer, quanto mais se aceitar isso, melhor.
Na verdade, nossa sociedade tem uma
imagem romântica de deficientes como seres indefesos e que não tem
a menor ideia do que estão fazendo. Ainda, programas idiotas como o
Teleton reforçam essa ideia de dependência
de
uma instituição ou uma causa que não existe, porque a inclusão
são direitos humanos e devem ser cumpridos
e pronto. Sendo assim, pessoas com deficiência são humanas e tem
sentimentos e querem namorar, o problema que
as pessoas têm
medo. Costumo repetir o mestre Yoda sempre quando ame falam do medo,
pois, o medo gera a raiva, a raiva gera o ódio
e o ódio
te leva o lado negro da força. A analogia da Força é óbvia, nosso
campo vital sempre é aquilo que você é de verdade e quando você
se encontra, você pode qualquer coisa. O próprio Yoda diz, ou você
faz ou você não faz, não existe tentar. Por
outro lado, a ideia do namoro sempre foi controversa aqui, porque
ainda ficou aquela vontade de pedir o dote ainda. Ou será se o
cadeirante for famoso e ter posses a família vai implicar?
Como disse, tudo gira em torno do marketing do bem, o politicamente
correto que escondem a canalhice alheia.
Tudo
isso começa a gerar neuroses
estranhas na família (principalmente, da mulher com deficiência),
que acha aquilo bonitinho, porém, acham que as pessoas com
deficiência não podem sofrer. Sofrer do que? O sofrimento pode ser
silencioso lá no travesseiro antes de dormir, isso pode gerar um
desejo de se matar, de não querer viver e assim, muitos desistem da
sua vida. As neuroses são tão grandes, que acho importante
inventarem personais psiquiatras para essa gente, porque chega as
raias do absurdo de acharem que não transamos. Não deixar viajar.
Não deixarem ficar sozinhos. Uma humanidade canalha para um mundo
tão lindo.