quinta-feira, abril 25, 2024

A podridão da rede Kwai - entre a certeza e a verdade

 





O filósofo Mario Sergio Cortella - que muitos chamam de filósofo pop - tem um pensamento peculiar sobre as atitudes éticas. Porque, segundo ele, quando pensamos em ética estamos pensando em um conjuntos de valores próprios que poderíamos usar para decidir as tres questões da nossa vida cotidiana: “Quero?”, “Devo?”, “Posso?”. Pois, existem coisas que eu quero e não devo, tem coisa que eu devo e não posso e tem coisa que eu posso, porém, não quero. Poderemos fazer a critica aqui - e demonstra como algumas coisas do senso comum estão enraizadas até na academia brasileira - pois, Cortella confunde ética (que é a filosofia que analisa coisas morais) e a moral (os costumes e os hábitos). De resto, poderemos fazer a colocação que sim, ele tem razão e tem a ver com a filosofia do direito do dever e do direito. 

Será que todo direito implica em um dever? Sera que sem nenhum dever implica em um direito? Será possível haver direitos sem deveres ou deveres sem direitos? Direitos são anteriores a deveres ou vice-versa? Isso implicaria em uma discussão muito mais ampla dentro do que poderíamos chamar de pensamento filosófico, onde os deveres e os direitos tendem a ser relacionados um ao outro. Se todas as crianças têm o direito de ter escolarizacao, por exemplo, então esse “TODAS” abrange até mesmo crianças com deficiência. Esse “direito de todos” se relativiza graças a um pensamento que poderia remontar o que a maioria tem certeza e o que é a verdade como realidade. Frases como “deficientes deveriam se inscrever na AACD”, é uma frase de certeza dentro de um passado muito remoto onde eramos trancafiados em instituições. Há uma caracterização da nossa cultura - bastante particular - que universaliza tudo que achamos ser belo e bom, por causa da nossa herança católica e, indiretamente, uma visão platônica das coisas reais. Mas, a certeza tende a ser relativa no sentido de certezas de valores particulares (individuais), como se mesclasse aquilo que “se acha” e aquilo que é. 

O que poderíamos colocar como “aquilo que é”? A verdade não é a certeza porque a certeza é aquilo que nos deixa seguros, aquilo que achamos certo e coerente dentro de nossas próprias crenças. Daí o senso comum segue acreditando muito mais nas certezas que os deveres com a sociedade não incluem os direitos garantidos para todo mundo, porque direitos são para todos. Dentro de comentários da rede de vídeos curtos Kwaii, há uma incongruência entre aquilo que se “acha” (que podemos chamar de doxa), com que realmente é um direito democratico. Uma pergunta é inevitável: há o direito de ofender ou discriminar deficiências ou minorias? Há o direito de enganar e vender uma realidade que não existe?

A primeira pergunta pode ser respondida com um não, mesmo porque, o direito de falar o que quiser é caracterizado como ofensa e pode ser motivo de processo. Comentários como “crianças autistas não devem ir a escola por serem agressivas”,  é uma crença dentro de casos específicos que podem ser contornados com mecanismos de inclusão dentro das escolas entre terem cuidadores e acessibilidade fisica. O problema é que há um discurso ideológico (bolsonarista) que isso é coisa de esquerda - a maioria dessas pautas é sim de esquerda - e se fizerem será instaurado o comunismo. 

Primeiro - não há nenhuma correlação dentro do discurso de incluir pessoas ou crianças com deficiência dentro de pautas da esquerda mais radical (socialismo/comunismo). Por outro lado, essa associação sempre foi feita por pessoas sem estudos e sem noção do que estão dizendo.  A questão de uma inclusão mais efetiva foi muito mais pautas liberais e sócio-democratas do que comunistas, mesmo porque, no tempo que Karl Marx escreveu sobre o socialismo científico, nenhuma dessas pautas eram nem mesmo cogitadas. 

Segundo - dentro do mundo e seus objetos da realidade (objetiva que chamamos de verdade), não há nenhum modelo de perfeição estética e nem uma padronização dos gêneros (há homossexualismo entre os animais) onde temos que rever algumas certezas (por isso elas sao relativas). Podemos colocar essas certezas em uma crítica kantiana que tudo pode ser analisado e centrado dentro de uma evolução linear, afinal, os primórdios humanos tínhamos pelos, rosto de símio, e não éramos como somos agora. 

Daí entramos na verdade em Kant. O filósofo Immanuel Kant (1724-1804), abordou a questão da verdade em sua obra (as críticas) de maneira bastante profunda e sistemática. Ele definiu a verdade como uma concordância do conhecimento com seu objeto, assim, um conhecimento é (de ser) verdadeiro quando está em acordo com o objeto no qual se refere. Ou seja, poderíamos perguntar se a “crença” de uma certeza pode ser verdade enquanto aquilo que existe de fato enquanto experiência entre todo mundo. Ai entre o dever moral em busca da verdade pois, para o filósofo, a busca da verdade é um dever moral. Para Kant, só seria possível agir de forma etica se se conhece a verdade e a busca pela verdade é um dever moral. Ora, Kant acreditava que a razão humana nos capacita a buscar a verdade e a compreender o mundo de forma racional. 

Na visão kantiana, a verdade não é apenas uma questão de conhecimento intelectual, mas também tem a ver com a nossa capacidade de agir de forma ética. Porque quando vamos em busca da verdade, estamos agindo de acordo com nossa natureza racional e moral. Além disso, a busca da verdade é essencial para a construção de uma sociedade justa e baseada em princípios universais. 

Mas existem princípios universais? A crítica desses “princípios universais” de Friedrich Nietzsche muito me agrada, porque na sua filosofia questionava toda a existência de valores absolutos e objetivos. Isso tem a ver com a frase: "Não há fatos eternos, como não há verdades absolutas." que tem a ver com uma reflexão da sua visão crítica sobre a existência de valores universais e objetivos. Ou seja, Nietzsche pensava que a verdade só era uma construção linguística é uma ilusão que pode ser reinterpretada e questionada. A proposta dele era uma “transvaloração dos valores”, assim, incentivando a criação ativa de significado e a reavaliação dos princípios morais e culturais. 

Muitos dizem “pula da janela e vamos ver o que acontece”, mas Nietzsche não questiona a verdade como realidade objetiva. Ele questiona as verdades morais, aquelas como “deficientes deveriam se inscrever na AACD”, ou “crianças autistas não podem estudar com outras crianças porque mordem e são agressivas” e até mesmo, “sou a favor do aborto ou eutanasia nesses casos” mostrando que a maioria (com suas certezas) sempre tem soluções faceis e preconceituosas. Que, na maioria das vezes, advém  de princípios ditos universais. 

Agora a segunda pergunta: “Há o direito de enganar e vender uma realidade que não existe?”, tem a ver com o “sonho” de muitas pessoas de serem “fazedoras de conteúdo” ou “influencer”. Mas, chegamos em uma análise mais proxima da indução e da fetichização da mercadoria onde uma induz o grande público a criar um fetiche por aquele objeto e que induz a ter o comportamento em ter esse objeto. Para que eu teria um Lamborghini se posso ter um carro luxuoso simples que daria para andar nas ruas do Brasil? Tem toda uma racionalização dentro de uma demanda de localidade, de poder e de respeitar as leis, nesse caso, de trânsito. Fora que há lombadas (aqui em São Paulo chamamos assim, mas em outros estados se chamam “quebra molas”), existem buracos, existem remendos mal feitos por companhias de água etc, que indisponibiliza eu ter um lamborghini.  

O que acontece é que o fetiche (que vem de Marx) tende a mostrar um status quo que, muitas vezes, o objeto não tem em si mesmo. Voltando ao exemplo do Lamborghini como produto fetichizado como luxuoso, mas não é necessário ter um carro desses como algo sublime. A fetichização da questão passa também como a indução de ser um poderoso influencers para ter um status, afinal, olhando as redes sociais e a questão da fama (que antigamente se restringiria somente na TV) sempre é um objeto importante.  Além da fetichização do objeto, existe a indução comportamental que é muito discutida na filosofia na  Teoria do Conhecimento (epistemologia), pois, parece ter uma diferença entre aquilo que se aprende como conhecimento e aquilo que somos induzidos como manipulação dos desejos. 

A indução de comportamento se refere a uma influência deliberada ou não deliberada que certos estímulos têm sobre as ações e escolhas das pessoas. Quando o Kwai diz para gravar 15 vídeos para engajar na rede - que a entrega desses vídeos estão baixos - eles estão induzindo a ter mais vídeos e o alcance (supostamente), pode ser real. E tem outras pessoas que dizem que o algoritmo é cego, coisa que não é verdade (quem sabe de programação). Na teoria, o algoritmo entrega aquilo que você gosta e curte assistir, porque ele leu sua metalinguagem e leu seu “gosto” por  aquilo. Hoje, se você procurar certo livro, por exemplo, vai chegar um monte de anuncio desse determinado livro. Por que? Os algoritmos leram sua procura como um interesse daquilo, do mesmo modo, a metalinguagem de leitura do objeto. 

Uma indução pode ser muito sutil - nesse caso, nem percebemos - mas é bastante poderosa. Porque um influencer pode moldar uma preferência do consumidor sempre incentivando a comprar determinado produto, adotar certos hábitos ou seguir determinadas tendências. Assim, quando uma rede começa a induzir você a fazer 14 a 40 vídeos para ser visto, ela está te colocando como uma tendência dentro de um comportamento induzindo a ideia de fama. 


domingo, abril 21, 2024

Bolsonaro não é Tiradentes

 






Se o penhor dessa igualdade

Conseguimos conquistar com braço forte,

Em teu seio, ó liberdade,

Desafia o nosso peito a própria morte!

(Hino Nacional Brasileiro)



Em todos os hinos brasileiros - até das Forças Armadas - têm liberdade nas suas letras. Mas alguém pode dizer que sabe o que é liberdade? Quando dizemos “o que é”, queremos indicar o objeto que está em tal local, e além disso, o local é uma letra de uma canção que representa alguma coisa e essa coisa é a nação brasileira. Poderíamos dizer todo tipo de coisa - como não amar os símbolos brasileiros porque a nação não cuida do básico - mas esta é acima da simbologia da liberdade (queiramos ou não) foram construídas as nações americanas. Aí se começa a ideologia republicana positivista - nomes como Joaquim Nabuco e Benjamin Constant - que tem que construir heróis nacionais. Um deles foi Tiradentes. 

O dentista Joaquim José da Silva Xavier (Tiradentes) , que era mineiro (Ouro Preto), não era um símbolo nacional até a república positivista. Como um dos expoentes da Inconfidência Mineira - movimento inspirado nas revoluções francesa e norte-americana - não deu certo porque aqui tudo tinha seu preço. Ora um dizem que ele foi enforcado e esquartejado (por ser pobre, claro), ora dizem que ele foi levado até a África e um mendigo foi enforcado no seu lugar. A questão é que ele virou um símbolo de libertar o Brasil de ser colônia de Portugal. Mesmo que algumas coisas não sejam verdade (como os brasileiros adoram dizer, mas mentem para si mesmos), a simbologia daquilo se transforma em um símbolo daquela etnia. Queiramos ou não - pouco me importa - Tiradentes e outras figuras, se tornaram símbolo do Brasil e de todos sobre queremos ser libertos de todo “lixo” que nos tentam colonizar. 

Desde quando inventaram a imagem do Bolsonaro (como um baluarte da esperança de mudança) eu alertei que ele e o Lula não são diferentes, não visam liberdade nenhuma e não honram nossos símbolos nacionais. Pensar em liberdade é você pensar como quiser sem ser atrelado em nenhum dos lados, sem se apegar em ideias ideológicas - e sim, estou pegando a ideia de Marx de distorção da realidade - onde muitos por serem contra X acham que tem que apoiar Y e isso é problemático no sentido de dar ao Brasil a verdadeira máxima que está escrito na bandeira: <<ordem e progresso>>. A frase de Comte onde o lema foi tirado é: <<O amor por princípio e a ordem por base, o progresso por fim>>, que, a meu ver, é o lema mais bonito da filosofia moderna e que poucos entendem. O amor une todos em uma causa, a base de tudo que existe e as muitas culturas é a ordem e no fim, diante dessa ordem que o amor deu, está o progresso. O espiritismo kardecista é positivista por excelência. O problema é o cientificismo que atrapalha exatamente esse progresso não deixando as ideias evoluírem. 

Mas voltemos à liberdade. E sim, ser liberto é ser livre das amarras ideológicas e que nada ajudam o Brasil e todos que tendem a não ter liberdade, pois, liberdade vai muito além daquilo as pessoas achar ser. Tem a ver em ser pessoas que pensam por si mesmos dentro de uma ótima crítica ao sistema.