quarta-feira, junho 11, 2014

Malévola e o medo do homem em perder a “masculinidade”







por Amauri Nolasco Sanches Junior


eu vi o filme Malévola e devo admitir que estou lendo muitas analises ruins e até ideias que nem estão num filme de “criança”, uma outra visão da “Bela Adormecida”. Um desses textos me fez procurar esse filme online e assisti com minha sobrinha, o nome é “A Misandria de Malévola” de André Forastieri do portal R7. Para quem não sabe, misandria são mulheres que tem ódio pelo sexo masculino, ou seja, o cara nem se deu o trabalho de enxergar a trama da historia e o porque a Malévola tinha tanto rancor do rei Stefan. Será que todo efeito não existe uma causa? Ou ele ficou ferido com a masculinidade da Bela Aurora ser acordada por um beijo na testa?

Todos nós crescemos com a história da Bela Adormecida e todos sabemos das consequências que essa historia trouxe para nossa sociedade ocidental que a mulher tem que ficar a espera no príncipe para lhe dar um beijo de amor e despertar ela do sono da infância. O termo adolescente é algo muito recente, então, quando a historia foi escrita, essa era a ideia. Ora, o homem desperta a mulher em ser mulher com um amor verdadeiro e esse amor começa sua trajetória como mulher. Imagina que na versão original o príncipe estupra a princesa (que pica seu dedo em um espinho e dorme) ela tem gêmeos e um desses gêmeos chupa o dedo e tira os espinhos e o rei mata a rainha para ficar com a Aurora. Perto dessa versão “macho alfa” da Bela adormecida, Malévola é “fichinha”.

Todo conto de fadas é algo arquetípico da psique humana e sem muito medo de errar, em Malévola, isso está muito evidente. Por que? Malévola mora em um reino encantado e é uma fada com asas, fadas são seres arquetípicos da inocência infantil, a fantasia que não pode deixar de existir nos primeiros anos (coexistem nos idealistas). As asas são o pensamento que voa conforme a imaginação nos leva, como um sonho que nos diz o que está escondido em nós. O reino dos Moors é esse mundo que não pode ser explorado, os humanos são todos os conceitos que a sociedade nos coloca, não podem entrar no reino dos Moors porque não podem ser explorado pela razão. Quando o ser humano tomou para si a razão, aprisionou o homem e a mulher em trabalhar para manter o mundo real, o amor não pode estar acima do dinheiro e poder. Malévola é a inocencia humana naquilo que é verdadeiro (a alma verdadeira e sua essência diante do real que pensamos ser verdadeiro), naquilo que todo ser humano é por natureza, mas Stefan é a ganância dos homens que não podem ser sonhadores, tem que ser homens bem sucedidos e fazerem tudo que a sociedade quer. Na verdade, isso é uma analise já feita por Campbell (que deu aquele entrevista clássica que se chama O Poder do Mito), que o feminino é o lado delicado que foi construído graças ao mito de gerações no passado, o masculino é aquele forte que tem todo o direito de trabalhar e fazer o que bem entender. Malévola era sonhadora e alegre e sempre brincava com os seres do reino de Moors, até chegar Stefan que lhe rouba o amor, quando se ama, não há limites. Mas numa noite, Stefan rouba as asas da fada para ser rei, lhe rouba o sonho para poder reinar e querer mandar até no reino de Moors. A razão rouba o poder da imaginação para reinar em um reino que não se pode entrar, não se pode ter de repente, certos domínios. O feminino é algo ainda, mesmo no machismo dominante, uma imagem indefesa e arquetípica dentro de uma sociedade vista num âmbito mais ou menos, acima de algo explicativo e concreto.

Depois nasce a Aurora e Malévola joga a maldição que quando a menina completa-se 16 anos, ela iria furar o dedo em uma roca de costura (um tipo de maquina de costura medieval) onde iria dormir para sempre e só acordaria se alguém lhe beija-se com o amor verdadeiro. Lembrem que ela não disse que era homem ou mulher, mas alguém, alguém que tenha um amor verdadeiro por Aurora. Na verdade, Aurora é filha do rei, o rei é Stefan que é a razão, o poder e a ganancia dá seus frutos e nisso nasce a princesa, mas Aurora é a outra parte esquecida de Malévola, a alma que resgata o lado negativo de tudo que vivemos, tudo que encontramos como dificuldades. Aurora é a alma de Malévola que nasce da ganancia e do poder, é o lado ingenuo e alegre de todo ser humano. Malévola é o ser humano desiludido, fechado em seus próprios pensamentos, dentro de si faz seus sonhos e esperanças serem seus súditos, é a alma sem asas, é a escuridão e o ódio e isso muda quando ela vê Aurora. Ela acorda a sua alma com um beijo, o amor de si mesmo faz ela sentir ela como ela é de fato, não algo produzido dentro de uma sociedade, mas algo dentro de uma imagem dentro de si mesmo. O mito de Narciso mostra ele “afogado” amando a si mesmo por causa de um reflexo, mas Malévola precisou enxergar a si mesmo para perdoar e no fim razão transtornada, morre brigando, pois Malévola mata o rei, mata aquele que quer destruí-la porque ela não obedeceu e ficou longe do seu domínio. O sonho mata a razão para consagrar a virtude e a união dos dois reinos.



No filme também, há outras desconstruções importantes como desconstruir uma imagem que o mal é gerado graças aspectos da vontade e temos que construir um histórico da onde vem esse mal. Eu não acredito no bem e no mal – por ser nietzscheriano e por eu acreditar que é sim uma medida cultural humana, um meio para dominação e os mitos tem uma conotação do heroico, o modelo que todo ser humano deve ser e esse “deve” constrói o que os dominantes querem na humanidade – porque tivemos prova que isso é muito relativo graças ao aspecto emocional, que tem a ver com o lado subjetivo, onde fazem uma construção quem é culturalmente aceito e quem não. Não devemos ter raiva, não devemos pensar em dar limites as pessoas, não devemos construir uma identidade relativa no aspecto do “bem” como o poder constrói esse discurso. O filme nos mostra a quebra de vários paradigmas e imagens dentro do esteriótipo das mulheres e as imagens criadas dentro desse estereótipo, como se as mulheres não pudessem reinar ou serem independentes sem um principe. Aliás, no filme isso é bem nítido, bem feito e bem trabalhado.